A Sala da Casa Que Nunca Foi Sua
Feridas familiares não aparecem nas fotos emolduradas. Elas moram nos cantos da sala, nas palavras engolidas, nos silêncios que pedem “paz” enquanto te encolhem. Se você cresceu pedindo licença para existir, este texto é sua chave simbólica de saída.
Contoterapia: quando a história cura o que a palavra não deu conta
A contoterapia usa histórias como espelhos emocionais. Ao ler um conto, você acessa o que estava mudo. Ao reescrevê-lo para si, você transforma a ferida em caminho. Não é mágica — é linguagem simbólica a serviço da sua cura.
Conto Terapêutico
“A Sala da Casa Que Nunca Foi Sua”
Ela cresceu numa sala onde o sofá tinha dono, a cadeira de canto tinha dono, até o silêncio tinha dono. Mas nunca houve lugar para ela.
Ali, todos falavam alto, mas ninguém dizia nada que ela precisava ouvir. Se tentava falar, diziam: “cale-se, não faça drama, não estrague a paz da família”. E assim, a paz era sempre dela que se cobrava — era o corpo dela que engolia as palavras, o peito dela que fazia de travesseiro para os segredos.
A sala tinha paredes decoradas com fotos. Ela estava em algumas, mas sempre de canto, como se fosse visita. O retrato da família perfeita não tinha espaço para os seus silêncios.
Cresceu acreditando que amor era sinônimo de obediência, e que gratidão significava aceitar pouco. Mas dentro dela, algo gritava. Uma voz pequena, insistente: “E se eu não quiser viver a vida que eles me deram? E se essa sala não for a minha casa?”
Um dia, ao voltar, percebeu: o sofá era o mesmo, os retratos estavam iguais, mas ela já não cabia mais. Não porque se tornou ingrata, mas porque se tornou inteira.
E naquele instante, entendeu: o amor verdadeiro não a faria se encolher. Então, pela primeira vez, saiu daquela sala sem pedir desculpas. Atravessou a porta com passos trêmulos, mas firmes. Levava apenas uma certeza: “Posso construir uma casa onde minha voz tenha espaço. Onde eu não precise me esconder para existir.”
🌱 Pergunta Terapêutica Final
Se a “sala da sua família” nunca te coube, como seria a casa simbólica que você mesma construiria para si?
Descreva em detalhes: as cores, os móveis, o silêncio, a presença. Escreva como se estivesse abrindo a porta dessa casa pela primeira vez.
Feridas familiares: sinais que você aprendeu a normalizar
- Você pede desculpas por sentir.
- Confunde gratidão com submissão.
- Se chama de “dramática” quando tenta pôr limites.
- Se sente visita na própria história.
Exercício de Contoterapia: Reconstruindo a Casa Simbólica
Objetivo: transformar o conto em um ritual de ressignificação.
1) Nomeie a sala
Escreva três frases que definem “a sala que nunca foi sua” (ex.: “Aqui meu silêncio é exigido”).
2) Mapeie as vozes
Liste as frases que te encolheram. Ao lado, escreva a resposta da sua voz adulta hoje.
3) Desenhe a sua porta
Descreva a saída simbólica: que limites você coloca, quem fica do lado de fora, o que entra com você.
4) Construa um cômodo seu
Detalhe um espaço seguro (cor, cheiro, luz, objetos). Esse é o lugar onde sua voz tem direito de existir.
5) Escreva o novo pacto
Finalize com um compromisso em primeira pessoa: “Eu não sacrifico minha voz para manter cenários bonitos”. Assine e date.
Ritual rápido de selamento
- Respiração de retorno: 4-6 ciclos lentos, com a mão no peito.
- Objeto-âncora: escolha um objeto para representar sua nova casa (chave, pedra, vela). Deixe visível.
- Fronteira verbal: uma frase-limite para usar quando tentarem te encolher (ex.: “Eu te escuto, mas não me calo por isso”).
FAQ rápido
“É ingratidão colocar limites na família?”
Não. Limite é uma forma de relação honesta. Ingratidão é exigir que você se anule para caber.
“E se eu não puder me afastar fisicamente?”
Comece pelas fronteiras internas e verbais. A casa simbólica é construída dentro antes de virar endereço.
Convite final
Hoje você não precisa caber na sala de ninguém. Escreva sua casa. E, quando estiver pronta, entre — sem pedir desculpas.
Escrevendo para se curar. Vivendo sem se esconder.
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